O analista que eu não pago

Ainda bem que não pago um analista. Metade do tempo gastaria só falando de você. Não que eu não tenha outros problemas ou que você seja, de fato, um problema. Sabe, tem aquelas coisas todas dos meus problemas familiares ou então a minha baixa autoestima que faz eu me sabotar. Tem ainda o medo de pontes que eu preciso - muito! - tratar e até o meu jeito reservada demais. Tem uma lista de coisas, traumas, medos e planos. Não é nada o fim do mundo, mas há muito a ser dito.

Mesmo assim, você me escaparia nas palavras... É que você, mesmo com tudo isso, mesmo com a vida indo e vindo, com o mundo girando, com a cabeça fervendo, ainda é o meu assunto preferido. Iria falar de como tenho vontade de te levar para longe do mundo inteiro quando está nos seus dias tristes ou desacreditados. Ou de de como tenho vontade de te levar pra longe de ti, porque sei o quanto se machuca. Poderia falar horas e horas sobre como descobri que havia caído num buraco sem fundo e admiti que te amava sem saída e sem volta. Contaria da primeira vez que te falei um "eu te amo". Você não deve lembrar, mas a sua expressão de quem não esperava, mas queria ouvir isso mais que tudo, foi linda. Tem aquela vez que passeamos no shopping agradecendo o ar condicionado e rindo de tudo. Tem o dia em que você me acolheu, em que eu te acolhi. Tem os fins de tarde e as noites com pizza. Tem tantas e tantas "aquela vez" para contar.

Contaria, sobretudo, de agora, claro. Sobre como é difícil te ver e apenas te ver. Sobre como eu queria ir para longe, mas é burrice se afastar. Sobre a minha vontade de ter os nossos dias bons, mas a incapacidade de te fazer ficar. Não esqueceria de falar sobre como te pego me olhando quase sem querer me olhar, mas querendo, e fazendo força para não querer, vivendo nesse dilema que eu só queria uma chance para solucionar. Claro que os seus detalhes que eu mais gosto não ficariam de fora: a sua voz, o seu jeito meio perdido, a cor do seu cabelo ou o seu gosto por músicas estranhas. Infelizmente, ele ia ter que me ouvir falar das outras pessoas que beijei para ver se dormia melhor nos últimos tempos e, principalmente, dos meus atuais esforços para começar tudo outra vez sem te ouvir ao fundo. E até nessa hora seria sobre você.

E o coitado ainda teria que tentar entender o que somos. Tentar entender o que fomos e o que podemos ser. E me fazer entender que ser, na verdade, é uma grande perda de tempo perto de sentir. Tudo para eu poder te explicar depois o que a gente deveria fazer. Mas, pensando aqui em silêncio, para falar de você já basta o que escrevo sem nunca saber o que vê. O analista que não pago deve agradecer.

Ainda bem que eu não pago um analista. Porque nem ele merecia tanto desencontro.
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Autor: Camila Costa

Dizem que "essa guria tem uma caneta no lugar do coração". É gaúcha, jornalista e quase adulta com 23 anos. Um dia chega lá.
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